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  • Texto e foto: Cristian

Ao fotografar aves e outros animais os bichos atraem tanto minha atenção que é comum ignorar as “outras coisas” que, juntas, acabarão definindo se a foto vai ser boa de se ver e rever, ou deletada. Estas outras coisas podem estar na câmera, na cena, ou na pecinha que fica atrás da câmera (também conhecida como fotógrafo). Registrei aqui minhas práticas e opiniões pessoais sobre a fotografia de aves.

Parte 1: regulagens em uma DSLR

Exposição: uso o A (automático com prioridade de abertura) sempre que der, a não ser que tenha um motivo muito especifico para usar exposição manual. Já perdi fotos incríveis por ter esquecido a câmera no M, com regulagem totalmente errada para a nova cena que apareceu. Aprender a usar o A direito vale muito mais que aprender o M.

Para aves em voo, se der tempo de regular, gosto de usar o M, por dois motivos: garante velocidade alta (se não quiser borrar uso de 1/1000 pra mais, 1/2000 e mesmo 1/4000) e evita que a exposição fique variando conforme o fundo muda de céu pra mato com o deslocamento da ave.

Na maioria das situações, estou saindo da medição pontual, que usava muito antes, para a matricial. Continuo com a medição pontual em bichos que ocupam pouco espaço no visor, ou quando estão contra a luz (num galho no alto da árvore com o céu atrás – mas aí em geral não tiro a foto, ver abaixo). Nesta situação uso pontual ajustado para -1 e se tiver, um flash regulado para -2.

Uso o +.- para calibrar o tom (claro ou escuro) – começo com -0.7 ou -1 e ajusto depois de bater uma foto. Quase sempre subexponho (-) porque as cores ficam mais bonitas e, se só der pra bater uma imagem, é mais fácil salvá-la se estiver muito escura do que muito clara. Em geral uso entre -0,7 e -2,0. Quanto mais escura a cena, maior a compensação que ela leva (cenas escuras, -1,3 a -2). Experimento, as vezes o -3 fica ótimo. (Para aves voando, é o oposto, uso entre 0 e +1 porque o céu é muito luminoso).

Foco: cuidado com o ponto de foco. Perdi uma das cenas mais raras que já vi, um tamanduá -bandeira acariciando a barriga do outro – porque na empolgação não vi que o ponto de foco estava no capim (era no tempo do filme, só percebi em casa).

O clichê sobre o foco no olho do bicho é verdade – poucas fotos sobrevivem a uma face ou olho desfocado. Há muitos outros jeitos melhores de tornar uma imagem criativa do que desfocando o rosto.

O foco contínuo (AF-C ou similar) é bom para animais que se movem relativamente devagar e continuamente, como crianças (foi feito pra filhos e esportes). Mudanças bruscas de plano ou voos rápidos parecem ser melhor captados pela técnica de apertar varias vezes o disparador, para ele focar de cada vez. Dito isso, na maioria das situações de bichos relativamente grandes eu uso o AF-C.

Tomo cuidado com o tracking focus – ele não pega aves pequenas que voam de repente, mesmo nas câmeras mais avançadas que já usei. É para objetos um pouco maiores (sempre falando no espaço que o bicho ocupa, não no tamanho real, obviamente).

OBS. AF-C e tracking não são a mesma coisa. As câmeras têm vários sensores de foco. Nas SLR, normalmente você escolhe o sensor que vai fazer o foco, conforme a posição do assunto. O AF-C vai manter o sensor escolhido focando o tempo todo, buscando o melhor foco enquanto o objeto se afasta ou se aproxima da câmera. O tracking vai fazer com que o sensor ativo mude automaticamente para acompanhar o objeto quando ele se move através da cena.

Flash: a regulagem geral para o flash que mais uso é OFF, se o objetivo é uma foto com qualidade estética. Quando sinto que o flash vai ajudar a dar um brilho, uso entre -2 e -2.7 (não é o mesmo que o da exposição – este é a regulagem do brilho do flash em relação ao tom geral da foto) para que seja só um brilho. Um dos problemas é que elementos em primeiro plano (galhos, capim) podem captar muito mais luz do flash do que o bicho e estourar. O outro é que o volume desaparece. As cores ficam “flechadas”, sobretudo as escuras e ainda mais as brilhantes. O olho fica branco. Se dependesse de mim, seria proibido fotografar beija-flor com flash. Em aves pequenas o flash provoca uma reação involuntária de abrir a asa pra cima – muita gente boa pensa que capturou um momento especial da ave prestes a voar, quando de fato o provocou.

Se é para tirar o retrato do bicho, e ele estiver numa luz ruim, muito escuro ou contrastado, uso o flash, sempre com no mínimo -1. Lembro que o flash tem um alcance muito menor que uma tele – o bicho lá no alto não vai melhorar, mas vai ver o disparo e pode fugir (um colega e seu flash já espantaram 7 de 10 araras-azuis que dormiam numa arvore seca ao amanhecer, com a lua no fundo, na minha foto aparecem três). Depois de usar, desligo.

Estabilidade: Uso tripé, quase sempre. Permite ficar muito mais tempo na mesma posição sem cansar. Melhora o enquadramento. O peso carregado é muito menor (claro que o equipamento pesa mais, mas fica a maior parte do tempo no chão e não no meu pescoço. O trabalho físico = peso x tempo, é muito menor), a não ser que esteja fazendo uma caminhada longa pra fotografar em curtas paradas pelo caminho. Mas aí em geral o objetivo não é fotografia artística.

A qualidade e tamanho do tripé e da lente precisam ser proporcionais – pensando na função para a imagem, o tripé é uma parte da lente tanto quanto o IS. Você não compraria uma lente cara com um sistema de estabilização (IS) baratinho embutido, ou um BMW com suspensão de carrinho chinês.

Lentes estabilizadas na mão, ainda mais as grandes, não fazem milagre. Numa 400mm sem TC a IS vai salvar a maior parte das fotos tiradas em velocidade 1/100 ou mais rápida. Menos que isso é risco, talvez os melhores sistemas salvem bastante coisa com velocidade 1/50. Acrescente o TC e esses mínimos aumentam proporcionalmente. O ideal é tripé mais IS.

Tremido, desfocado e borrado não são a mesma coisa. Tremido é um movimento pequeno e indesejado da câmera, que o tripé resolve e o IS ameniza, e nunca vi uma foto melhorar por estar tremida. Desfocado é um desencontro entre o plano que você quer destacar e o plano que está em foco (ou nenhum plano em foco). Dificilmente funciona, porque nosso olho foca pra destacar. Borrado é quando uma velocidade muito baixa de obturador (em relação ao movimento da câmera ou do bicho) faz com que o mesmo ponto seja gravado como uma linha. Isso pode dar certo e vale a pena experimentar, especialmente quando o borrado vem do movimento da câmera. Com a câmera parada o objeto (em vez do fundo) é que borra, e isso dá um uso interessante pro flash, que “congela” o final do movimento – já abusaram disto para dar a impressão de velocidade em carros. A velocidade para estes efeitos depende da velocidade relativa do bicho (tempo que leva pra atravessar a imagem) – em geral tento algo como 1/10 ou 1/20 (usando o S e colocando o ISO bem baixo).

Bom lembrar também que o IS ou o tripé não congelam o movimento do bicho, só compensam os movimentos da câmera. Para bichos se movendo que não queremos borrar, só a velocidade alta. Daí não preciso de tripé nem de IS.

Na próxima parte, as “outras coisas” da pecinha que fica atrás da câmera.